terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Phelps e o Posto 9


Na semana em que se divulgou uma fotografia na qual o maior nadador de todos os tempos aparece fumando maconha, também houve um confronto entre policiais e populares durante uma ação para coibir o consumo da droga na praia de Ipanema, no Rio de Janeiro. Os dois episódios, que se conectam pelo entorpecente envolvido, tiveram repercussões diferentes que merecem ser comparadas.

Michael Phelps veio a público pedir desculpas, prometeu que isso não se repetirá e pensa em parar de competir após os próximos Jogos Olímpicos, abreviando sua carreira. Alguns patrocinadores ainda o apoiam e seu arrependimento foi aceito por órgãos esportivos internacionais. No entanto, o ganhador de oito medalhas de ouro em Pequim não escapou de punições. A federação norte-americana o suspendeu por três meses, com perda de ajuda financeira inclusive, e seu contrato com uma marca de cereais não será renovado. As penalidades se devem à conduta incompatível com a de um atleta que é modelo para a juventude.

Já no Posto 9 de Ipanema, policiais, ao abordarem um rapaz que fumava maconha, foram cercados e feridos pelos frequentadores da praia. Na confusão, o carro da PM foi danificado. No dia seguinte, jovens consumiam normalmente a droga no Posto 9 e apitos reapareceram, um velho costume usado para alertar sobre a presença da polícia. Em Brasília, os ministros Paulo Vanucchi (Direitos Humanos) e Carlos Minc (Meio Ambiente) estudavam mudanças na lei para resguardar os consumidores de droga. A intenção é protegê-los do constrangimento de serem abordados. Só faltou proporem uma punição para os três PMs hostilizados em Ipanema.

Esses relatos servem para expor a disparidade do que representa consumir drogas em cada país. Sabendo-se que aqui os tóxicos são os maiores propulsores da criminalidade, o episódio em Ipanema ganha significância. Enquanto a sociedade e as autoridades brasileiras não combaterem a procura por entorpecentes, como esperar que meninas e meninos não os experimentem? A insistência na blindagem do usuário é o mais forte aliado do tráfico e da violência. A sorte de Phelps é que ele estará aposentado em 2016, ano em que os Jogos Olímpicos podem ser no Rio. O Posto 9 seria um péssimo exemplo para ele, assim como o incidente ocorrido lá é para o Brasil.

* Publicado em Zero Hora, 10 de fevereiro de 2009; debatido no programa Conversas Cruzadas, da TV Com, 10 de fevereiro, e no programa Polêmica, da Rádio Gaúcha, 11 de fevereiro de 2009.

Longa vida ao jornal!


O fim do jornal diário e em papel vem sendo anunciado nos Estados Unidos ao longo da década. Em 2004, o professor Philip Meyer previu que em 2043 ele morreria. Em 2006, a revista The Economist perguntou: quem matou o jornal? No ano seguinte, Arthur Sulzberger Jr., editor do New York Times, disse não saber se em cinco anos a publicação continuaria a ser impressa. No ano passado, foi a revista New Yorker quem proclamou que os jornais estão morrendo.

A informação em tempo real na rede mundial de computadores seria a responsável por essa extinção. O raciocínio é claro. É difícil crer que a geração da internet, tendo dispositivos portáteis que permitem acessar vídeos e textos em qualquer lugar, leia um jornal impresso.

No entanto, a realidade no Brasil e no mundo indica que há certa precipitação e exagero nessas profecias apocalípticas. Os jornais brasileiros encerraram 2008 com uma circulação 5% maior, passando de 4,14 para 4,35 milhões de exemplares pagos. O crescimento nas vendas em 2007 e 2006 já havia sido de 11,8% e 6,5%. E a média mundial também tem subido mesmo que com índices menores.

A partir desses resultados, nota-se que a questão mais atual a ser respondida diz respeito às razões que fazem o jornal manter sua força a despeito da lógica da era digital. Em termos tecnológicos, uma delas é antiguíssima: o papel. Hoje em dia é possível ir à beira da praia, deitar no sofá ou andar de ônibus acompanhando as notícias em um computador portátil. Porém, fora o desconforto visual proporcionado pela tela, ele não pode ser exposto à água ou areia. Quedas nem pensar. Ser dobrado a um tamanho adequado menos ainda. Assim, o papel continua sendo uma solução melhor. Em nível comercial, não há o que supere a sua praticidade. E seu valor econômico é ínfimo para o usuário. Por exemplo, a perda de um jornal nem se aproxima da preocupação de quem tem um celular roubado.

Outro aspecto que tem contribuído para o fortalecimento do veículo são as edições populares a um preço menor para o leitor. Além disso, como na frase atribuída a Keynes, no longo prazo todos estarão mortos. Logo, discutir circunstâncias de 2043 deveria ser menos importante do que a verificação das transformações que estão permitindo que a imprensa escrita seja uma opção contemporânea. No geral, os jornais diários ainda são portais de informação melhores e mais organizados dos que os da internet, tornando-se pontos de partida para aprofundamento na rede de computadores. Não há antagonismo, mas complementação.

É possível que um dia os jornais impressos sejam superados por algum avanço tecnológico, mas isso está mais longe do que se prevê. Por enquanto, como se costuma dizer sobre os reis, se o jornal está morto, longa vida ao jornal!

* Publicado no Agora de Rio Grande, 10 de fevereiro, na Gazeta do Sul e em O Informativo do Vale, 11 de fevereiro, em O Nacional, 13 de fevereiro, e no Diário de Canoas, 23 de fevereiro de 2009.

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Salvem os banheiros públicos


Ensinam os especialistas em marketing que o banheiro não é razão para alguém escolher um lugar para ir, mas encontrar um toalete sujo é o suficiente para uma pessoa nunca mais voltar a um estabelecimento. Nesse sentido, sanitários públicos poderiam ser indicadores da capacidade de recepcionar turistas. Veja por exemplo Gramado, referência para aqueles que visitam o Rio Grande do Sul a lazer. Alguém já ouviu reclamação quanto aos banheiros de lá? Pelo contrário, o asseio é uma de suas marcas, assim como o respeito à faixa de pedestres, para citar outro sinal de civilidade presente na serra gaúcha.

No entanto, constata-se que latrinas limpas são espécies raras em outras cidades turísticas do Estado. É o caso de Capão da Canoa, município do litoral norte que desde 2008 se tornou símbolo da preservação ambiental por causa de suas corujas. Sob o ponto de vista estatístico, tende a zero a possibilidade de encontrar-se um banheiro apropriado para o uso na orla. Incluem-se aí os equipamentos móveis denominados ecológicos. O irônico é que quem ousa abrir a porta de qualquer um deles pode pensar que armas proibidas até em guerras chegaram aqui ao ser atingido por odores pútridos e pelo visual grotesco.

Pode-se alegar que ao menos existem esses banheiros. Antes disso - tentando evitar a escatologia - dir-se-ia que o “número um” era reservado para o mar e o “número dois” para os cômoros. Apesar de ecologicamente errado, duvida-se que a primeira alternativa tenha terminado e a segunda só acabou porque esse local está em extinção. E talvez essa fosse ainda uma opção mais tolerável para a integridade do cidadão do que entrar nos sanitários móveis de hoje. Será essa outra razão para Fepam lutar pela recuperação das dunas?

Por outro lado, haverá quem diga que dada a característica do que se faz nas latrinas de modo corrente é natural que o resultado seja desagradável. Concorda-se, mas água, sabão e desinfetante de vez em quando poderiam amenizar essa situação. A questão é que, como tudo na vida, bastaria um pouco de boa vontade para melhorar isso. Gramado consegue, por que Capão não? As corujas já garantiram seu espaço. Agora, salvem os banheiros públicos. A natureza humana vai agradecer.

* Publicado em A Razão, 05 de fevereiro, na Gazeta do Sul, 07 de fevereiro, no Diário Popular de Pelotas, 10 de fevereiro, em O Correio de Cachoeira do Sul, 12 de fevereiro, e no Diário de Canoas, 13 de fevereiro de 2009.