quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Renda-se, estamos cercados

Resolvi batizar meu filho na mesma paróquia onde recebi esse sacramento. Terminada a cerimônia, era o momento das fotos. Queria uma com toda família na frente da igreja, igual à que tenho do meu batizado. Como a porta principal estava fechada, saímos por um acesso lateral. Ao chegar à rua, a decepção. A entrada do templo estava cercada. A fotografia teve que ser feita na calçada, tendo as grades como moldura.

Lamentei que a insegurança tivesse abraçado com barras de ferro a minha igreja. Porém, lembrei de algo que foi comentado na palestra preparatória do batismo. Mais de 40 grupos se reúnem na paróquia todos os dias nos mais variados horários. Crianças, jovens, adultos e idosos. Pessoas que necessitam de ajuda ou que querem colaborar. Elas vão lá pela fé que têm, mas conclui que também por se sentirem seguras rodeadas pelas grades.

O aumento no número de shoppings, preferidos por muitos até para o almoço familiar de domingo, tem a mesma causa, o real sentimento de proteção, diferenciando-se das vias públicas onde o temor é permanente. Aliás, fortificações são desde a antiguidade razões para que o ser humano se sinta seguro, conviva socialmente e mantenha relações econômicas. As biografias das cidades sempre se confundiram com a história de suas muralhas. E os nossos doces lares, com suas trancas e cadeados, são o que além de prisões de segurança máxima?

No espaço urbano, como última estância da vida sem grades restam apenas alguns grandes parques, por enquanto, pois em breve a insegurança fará todos capitularem nesse ponto também.

Logo estarei levando meu filho aos parques. Como não desejo que ele pise em agulhas infectadas, preservativos usados ou excrementos, vestígios de atos praticados nesses espaços quando a maioria descansa em casa, também quero gradear as áreas verdes.

Insegurança é uma condição social presente. Para modificar isso é necessário um processo demorado com abrangência cultural e econômica. Mas hoje não há escapatória. Renda-se ao cercamento dos parques de sua cidade porque já é assim que vivemos em nossas casas.

* Publicado em O Globo Online, 09 de outubro, em O Informativo do Vale, 10 de outubro, em A Razão, 11 de outubro, e em O Correio de Cachoeira do Sul, 14 de outubro de 2008, e no Diário de Canoas, 22 de abril de 2009.

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