terça-feira, 19 de janeiro de 2010

A impunidade castiga


A constatação de que nenhum político condenado por ser corrupto acabou preso gera uma sensação de que ninguém é punido por esses desvios. Isto seria apenas um simples engano se não fosse o assunto tão funesto. No mesmo sentido de que não há almoço grátis, não existe crime sem sequelas. Nem que seja só para a vítima, no caso, a sociedade, que sempre padece com as consequências da corrupção.

Para entender o raciocínio, toma-se como exemplo a questão ambiental, tão em evidência. Quando alguém joga um papel no chão, o lixo no rio ou um cigarro aceso na grama é quase improvável que venha a sofrer qualquer tipo de punição. No entanto, quando a boca de lobo entope e a rua alaga, um curso d’água fica poluído e os peixes morrem ou um incêndio começa e os animais precisam fugir, muitos acabam pagando por algo que um ignorante fez impunemente.

O mesmo acontece com o extravio dos recursos públicos e a propina recebida. O autor do crime se livra da prisão, porém os efeitos dos seus atos se multiplicam em situações que prejudicam a todos. É o dinheiro para saúde, educação, segurança pública etc. que fica reduzido porque parte do que havia está agora na bolsa, na meia, na cueca de outrem.

Não se pode avaliar a existência da impunidade se restringindo apenas a quem evita a cadeia. Quando o corrupto deixa de pagar pelo que fez (nem devolve o que levou), a sociedade toda é castigada. Por isso, é necessário mudar pensamentos e posturas. Equivocam-se aqueles que imaginam que o fato de alguém não ter sido exemplado da forma devida só afeta quem escapou. Isso acaba implicando na ideia corrente de que “é revoltante, mas não tem nada a ver comigo”.

Levando essa reflexão ao extremo, até como incentivo para uma insurreição com resultados, deve-se dizer que, cada vez que um político mete a mão no dinheiro público, ele na verdade está tirando do seu bolso. E o que se faz quando isso de fato ocorre? Depois de gritar “pega ladrão” e da indignação, busca-se proteção e garantias de que nunca mais isso se repita. Alarme, grades, cerca elétrica. Qualquer coisa para evitar que se aproximem do que é nosso. Se os corruptos não são presos, ao menos há algo que pode ser feito. Impedir que eles fiquem perto das verbas públicas. Será que se consegue? Outubro dirá.

* Publicado em Zero Hora, 19 de janeiro de 2010.

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