sábado, 14 de junho de 2008

Estátua, viva!

Nunca se ouviu falar em depredação de estátua viva, essa atividade desenvolvida por atores que angariam contribuições ficando imóveis.

Em compensação, os verdadeiros monumentos estão sendo barbarizados pelos que, na falta de algo útil para fazer, expressam a sua ociosidade destruindo o patrimônio comum.

A covardia é óbvia. Enquanto o artista que se faz de escultura se encontra em locais com platéia e pode responder à ação indesejada com um cascudo, as figuras históricas às quais se prestou o tributo em pedra ou metal são atacadas às escondidas e, inanimadas, sofrem em silêncio.

As estátuas vivas eram uma das características das festividades medievais e renascentistas, tais como as chegadas de reis e governantes nas cidades. No início do século XX, Olga Desmond, uma bailarina alemã, fazia imitações nuas de obras de arte clássicas. Em 1945, uma estátua viva apareceu em uma cena do filme francês Les enfants du Paradis.

E nos anos 60, uma dupla de artistas de Londres, Gilbert e George, incluíram-se entre os pioneiros dessa atividade. Ou seja, nada de novo na vida urbana.

A partir dessas observações, podem-se ter algumas idéias divertidas para embargar o vil recreio dos que danificam os bens públicos.

A primeira delas seria empregar os intérpretes de estátuas vivas para substituir os monumentos. O problema seria como realizar um concurso. Bons candidatos entregariam as avaliações em branco, pois não se mexeriam para responder as questões. Aprovam-se todos?

Aperfeiçoando o conceito, ao invés de fazer uma seleção aberta para atores, seria realizada uma convocação secreta de seguranças para a tarefa. Imaginem o vândalo se preparando para operar a selvageria e sendo surpreendido pela reação enérgica da alegoria que ele imaginava inerte. Mais do que uma pegadinha de programa de tevê, isso seria redentor para todos que respeitam esse patrimônio.

Não se faria isso em todos os lugares, bastariam essas histórias circularem para atingir a ousadia dos mais medrosos. Porém nada superaria em resultado uma medida provisória do Todo-Poderoso que realmente concedesse vida às estátuas.

Imagine o fanfarrão pronto para atacar um monumento eqüestre e, de repente, o capuz do seu casaco fica pesado.

Ele olha para cima, sentindo um cheiro ruim, e a segunda carga explode contra o seu rosto. O cavaleiro imortalizado, do alto do garanhão, sentencia: Sai fedendo daqui guri!

Sabe-se que essas sugestões não são viáveis, nem possíveis. Elas servem para chamar atenção do quão pusilânime são os atentados contra os monumentos das cidades. Há a necessidade urgente da conservação desse patrimônio histórico.

É preciso de alguma forma dar uma vida protegida para nossas estátuas. Isso já mereceria um viva.

* Publicado no Diário de Canoas, 14 de junho, em O Informativo do Vale, 16 de junho, no Jornal VS, 30 de junho, e em A Razão, 31 de julho de 2008.

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