segunda-feira, 30 de junho de 2008

Retrato de um cavalo urbano

Porto Alegre aprovou um programa de redução gradativa de veículos de tração animal que estabelece em oito anos o fim desse meio de transporte. No século 21, as carroças ainda ocupam espaços nas vias públicas não só da capital, mas em todo o Rio Grande do Sul. Elas sobrevivem devido ao papel econômico que desempenham. Nessa situação que envolve veículo, homem e animal, a presença do cavalo em meio à vida urbana é um dos pontos mais polêmicos da questão.

Eqüinos vivem em média de 25 a 30 anos. Há animais trafegando que ultrapassaram décadas tão distintas quanto os anos 80 e 90 e a atual. Imagine um cavalo que no início puxava uma carroça de frutas e verduras, rumando para as vilas e bairros onde esses produtos eram vendidos. Às vezes, até fazia fretes. Atividades um tanto mais respeitadas se comparadas a hoje, em que na maior parte das vezes só transporta lixo. Restos catados por aí.

Ele pode ter tido muitos donos. Quando era novo e saudável valia o equivalente a uns R$ 1 mil. Agora, velho, magro e doente, não custa mais do que R$ 100,00. Por vezes, se o proprietário se descuidava, era furtado. Na última vez, foi levado enquanto pastava nas margens de um arroio que também serve de esgoto para a cidade.

Seus problemas de saúde começaram devido à dificuldade de acesso a um tratamento veterinário. Ocorrências médicas se repetiram como lesões nas patas e tendinites, ferimentos causados por maus-tratos e verminoses. Resultados de carroças construídas irregularmente, com pneus gastos e correias improvisadas, e de comer em qualquer lugar, qualquer coisa.

Morou em várias localidades da região. Algumas vezes, teve registro e até placas. Sonhou com exames veterinários anuais, com carroças que atendessem as normas técnicas e com condutores gentis. No momento, é visto como entrave nas ruas de maior trânsito e fator de aumento no congestionamento.

Quase balzaquiano, pode-se dizer que esse animal imaginado está à beira da morte. No entanto, a espécie a qual pertence está cada dia mais viva na nossa realidade. É necessário administrar a sua presença no meio urbano e resolver a sua situação sanitária precária. Acima de tudo, é preciso dar respostas às carências sociais dos seus donos. Proibidos ou não, todos fazem parte das nossas cidades.

* Publicado no Diário Popular de Pelotas, 30 de junho, e em O Correio de Cachoeira do Sul, 02 de julho de 2008.

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