domingo, 24 de fevereiro de 2008

Cartão extraviado

Certa vez li uma reportagem sobre jovens e o dinheiro. Uma estudante disse entender que o cartão de crédito da família era algo que vinha do governo, podendo ser gasto à vontade. Não sei medir se era alienação ou piada. Só sei que a compreensão que a garota tinha da situação financeira dos seus pais é a mesma da ex-ministra da Igualdade Racial em relação aos cofres do seu país.

Matilde Ribeiro foi a primeira a ser expiada pelo abuso dos cartões no governo federal. Porém, as evidências revelam que ela apenas cumpriu a sua missão. Matilde agiu igual a qualquer outro da raça humana com créditos ilimitados. Aliás, ela empregou de forma semelhante uma das duas desculpas em voga. Consumiu R$ 171 mil e declarou que não sabia como usar o cartão. Nem imagino quanto ela teria gasto se soubesse utilizá-lo. A outra opção era dizer que só fez o que todos fazem. Seria mais verossímil, mas igualmente reprovável.

Matilde não pode ser a única a sair. Seus gastos são trocados perto do volume de saques em dinheiro feitos em 2007. Foram cerca de R$ 45 milhões em retiradas, mais da metade do dispêndio total.

Hoje, a tecnologia do crédito eletrônico está até nas mais prosaicas e distantes localidades. Nem toda transação que só ocorre em espécie é ilícita, mas quase todas as que são precisam de grana viva, tais como as que envolvem pirataria, jogo do bicho, drogas, armas ilegais, lavagem de dinheiro, prostituição e propina. Muitos devem ter sacado apenas para ter algum no bolso, comprar cigarros ou chicletes. No entanto, investigar é necessário.

Assim, fica muito difícil não ter a sensação de que há desvios de nossos tributos. Já tive uma experiência parecida. Extraviaram um cartão que não solicitei. Pior, utilizaram todo o meu crédito. Perdi tempo e paciência tentando provar que não pedi, não recebi e não usei o tal cartão. Essa é a frustração que sinto agora.

Por acaso alguém sabe qual é o telefone 0800 para abrir um protocolo de reclamação contra a farra dos cartões? Conheço a resposta. São os números que vou digitar quando tiver acesso a uma urna eletrônica.

* Publicado no Diário de Santa Maria, 18 e 25 de fevereiro de 2008.

Nenhum comentário: